Saúde baseada em valor na insuficiência cardíaca: qualidade de vida e análises de custos

Resenha do artigo:

Ghisleni EC, Astolfi VR, Zimmermann L, Lira CNL, Faria do Nascimento E, Etges APBDS, Marcondes-Braga FG, Bacal F, Danzmann LC, Polanczyk CA, Biolo A. Value-based health care in heart failure: Quality of life and cost analysis. Clinics (Sao Paulo). 2023 Oct 29;78:100294. doi: 10.1016/j.clinsp.2023.100294. PMCID: PMC10630105.

A insuficiência cardíaca (IC) mostra-se com prevalência crescente à medida que a expectativa de vida e os tratamentos evoluem. Estes pacientes nem sempre possuem qualidade de vida adequada, ainda, podem apresentar sintomas limitantes para a realização das atividades diárias. Esta síndrome, que não possui cura, demanda acompanhamento médico regular e altos gastos relacionados ao tratamento e a episódios de descompensação.

Este estudo teve como objetivo a mensuração da qualidade de vida e de custos de pacientes ambulatoriais (não descompensados), no Brasil, de acordo com a classificação NYHA, como uma forma de introdução do conceito de saúde baseada em valor.

Neste estudo transversal, multicêntrico, foram selecionados pacientes com IC com fração de ejeção <50% provenientes de três hospitais brasileiros: Hospital de Clínicas de Porto Alegre (1), Instituto do Coração (2) e Hospital Universitário de Canoas (3). Os dados foram coletados entre Outubro de 2018 e Janeiro de 2021. Dois questionários validados sobre qualidade de vida foram aplicados, o primeiro, SF-36, é um questionário genérico e avalia a qualidade de vida em 8 aspectos; o segundo, Minnesota Living with Heart Failure Questionnaire (MLHFQ), é um questionário específico para IC. Outros dois questionários para rastreamento de sintomas de ansiedade e depressão foram aplicados, os Inventários de Beck. Já os custos do tratamento foram calculados usando o método de TDABC (time-driven activity-based costing), que é o padrão ouro para estudos de microcusteio em saúde, levando em consideração todo o ciclo de cuidado em saúde. A análise de gastos considerou transporte, medicação, consultas (médico, nutricionista e enfermeiro), exames de sangue e de imagem, assim como infraestrutura dos hospitais, chegando ao custo em R$/h gastos por paciente.

Cento e noventa e oito pacientes foram incluídos no estudo, 112 provenientes do centro primário, 48 do Hospital 2 e 38 do Hospital 3. De toda amostra, 56% eram homens, fração de ejeção média foi 29% [24.0, 35.7], com a seguinte classificação funcional: 28.3% NYHA I, 46.5% NYHA II e 25.3% NYHA III/IV.

Os resultados do MLHFQ apresentaram diferença significativa entre as classes funcionais (p<0.05). A figura 1 representa os domínios do SF-36 (pontuação menor significa pior qualidade de vida) e a pontuação mediana do MLHFQ (pontuação menor significa melhor qualidade de vida) de acordo com classificação funcional NYHA, demonstrando relação diretamente proporcional entre qualidade de vida e NYHA. Os questionários de ansiedade e depressão não apresentaram diferença estatística de acordo com a classificação NYHA, porém mais de 30% da amostra foi caracterizada por sintomas moderados a severos de ansiedade e depressão. E quando os domínios dos questionários foram comparados por sexo, apesar de resultados piores nas mulheres, não foi observada diferença estatística.

Os gastos encontrados foram maiores conforme a piora da classe funcional em 6 meses. O custo total com medicação foi semelhante entre as classes, mas correspondeu a 57% do custo total de pacientes NYHA I e a 20% do custo de pacientes NYHA III/IV. A maior parte dos gastos de pacientes NYHA III/IV foi com exames laboratoriais e de imagem. Saúde baseada em valor é importante para garantir a sustentabilidade dos sistemas de saúde, entretanto este conceito está apenas sendo introduzido em alguns países. Neste estudo, os autores descreveram piora da qualidade de vida e aumento dos custos em pacientes com funcionalidade pior, além disso, foi sugerido que mulheres parecem ter piores pontuações não só na qualidade de vida, mas também em sintomas de ansiedade e depressão. Mapeando estes dados, será possível promover ações que visem melhorar o atendimento ao paciente e, ao mesmo tempo, reduzir gastos em saúde. Como já mencionado, a IC pode agregar muita comorbidade à vida do paciente, portanto, introduzir ações de saúde baseada em valor são fundamentais para reduzir prejuízo funcional.

Elaborada por
Eduarda Chiesa Ghisleni
Vitória Rech Astolfi
Larissa Zimmermann
Camila Nogueira Leandro Lira
Eduarda Faria do Nascimento
Ana Paula Beck da Silva Etges
Fabiana G Marcondes-Braga
Fernando Bacal
Luiz Cláudio Danzmann
Carisi Anne Polanczyk
Andreia Biolo
Data da Resenha
30/01/2024
Eixo Temático
Doenças Cardiovasculares e Fatores de Risco
Serviços de Saúde e Políticas Públicas
Eixo Metodológico
Análises Econômicas

Figura 1: Qualidade de vida de acordo com os domínios do questionário SF-36 e questionário MLHFQ estratificada por Classe Funcional NYHA PF: capacidade funcional | RP: aspectos físicos | BP: dor | GH: estado geral de saúde | Vit: vitalidade | SF: aspectos sociais | RE: aspectos emocionais | MH: saúde mental

Figura 2: SF-36 de acordo com o sexo.

Valores maiores significam melhor qualidade de vida.

Linha vermelha: sexo feminino | Linha azul: sexo masculino

Tabela 1: Custo de pacientes ambulatoriais, após 6 meses de seguimento, de acordo com a classe funcional.

Obs: valores em US dólares.

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